Desde setembro de 2019 tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei nº 4862/19, proposto pelo Deputado Zé Vitor (PL-MG), que busca incluir a preferência de contratação com o Poder Público, para empresas que passaram pelo processo e foram certificadas, obtendo selo de qualidade emitido pela ISO, Organização Internacional de Padronização.
Essa é uma discussão que se desenrola há anos, pois alguns entendem que a inclusão no processo licitatório da referida exigência é uma limitante para a concorrência que iria ao encontro do que prevê a Constituição Federal (CF), no seu inciso XXI, do Art. 37, pois, de acordo com o texto da Carta, as exigências de qualificação técnica e econômica devem ser somente àquelas indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações, sendo que tal certificação um preciosismo desnecessário.
Apesar disso, diversos órgãos têm implementado a referida certificação como um critério de pontuação técnica, ou seja, não limita a participação de nenhum interessado, mas qualifica de forma diferenciada quem mantêm o referido selo. Tal condição possui precedentes no TCU, conforme consta:
“(…) Por outro lado, não haveria óbice para a utilização do aludido certificado para atribuir pontuação a uma empresa licitante, dado que isso permitiria reconhecer seu diferencial em relação a outras que não comprovaram a adequação de seu sistema de produção aos critérios de qualidade estabelecidos em tais normas. Por conseguinte, votou por que se negasse provimento ao pedido de reexame, mantendo-se os exatos termos do Acórdão nº 1.612/2008-Plenário, no que contou com a acolhida do Plenário. Precedente citado: Acórdão n o 2461/2007, do Plenário. Acórdão n.º 1085/2011- Plenário, TC-007.924/2007-0, rel. Min. José Múcio, 27.04.2011.”
Muito se prega com relação à restrição de competitividade e prejuízo a Administração Pública, que deve se sobrepor a eventuais certificações que não qualificam efetivamente os participantes, nem indicam que será a melhor contratação pelo interesse público, não há como negar que deve ser completamente desconsiderado o esforço das empresas que procuram meios de qualificar seus sistemas de produção e fornecimento de serviços, sendo um incentivo o reconhecimento da Administração Pública desse investimento.
Assim, enquanto não houver resolução legal com um deslinde do Projeto de Lei nº 4862/19, que está parado desde 2021 sem parecer de Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC), exigir como requisito de habilitação ou para determinar desclassificação de participantes em certames para contratações com a Administração Pública, encontra óbice na defensiva aplicação abrangente da CF, sendo que os órgãos podem se valer apenas para qualificar a técnica e atribuir pontos às empresas que se preocupam com a certificação de qualidade de seus produtos e serviços disponíveis no mercado, permitindo a competitividade não restritiva.
Tamara Henriqueta da Silva Ojeda, Advogada no Vigna Advogados Associados